No inferno é assim

Natali Carvalho
2 min readNov 10, 2020

--

Ilustração: Thomas Rouzière

Escutei recentemente que o verdadeiro castigo do inferno é ao chegar lá, ver quem você realmente é e quem você poderia ter sido. Isso me atravessou de uma forma que ainda não consigo traduzir. Fico pensando sobre isso o tempo todo. Quem eu poderia ter sido?

Se eu tivesse ido para aquele lugar ao invés de ter escolhido ficar. Se eu tivesse deixado de ir e ficasse em casa. Se eu tivesse dito sim ao invés de não. Ou mesmo se eu tivesse dito ao invés de calado. Se eu tivesse sido condescendente antes de ter dito falado minha opinião. Se eu tivesse escolhido aquela pessoa ao invés do meu conforto. Ou mesmo se eu tivesse escolhido a dúvida ao invés da segurança. Todas essas situações teriam me levado para quem eu realmente deveria ter sido?

Mas o que me agonia mesmo é pensar que eu já sou o máximo que posso ser. Tenho medo de já ser isso, então o inferno não faria diferença. Não tenho medo de pedir perdão, nunca tive medo de tentar consertar o que eu quebrei, de usar tudo de mim para que as pessoas que magoei soubessem que me arrependo. Me pergunto se não teria sido menos doloroso apenas aceitar o fim sem uma explicação.

As vezes me acho uma boa pessoa. As vezes tenho certeza que posso ser muito cruel. As vezes eu sou os dois. No entanto, eu nunca neguei ambos. Estou vagando por esse mundo meio perdida e um pouco entediada também. Isso é tudo o que eu posso fazer? É assim que a vida é? A rotina, o cansaço, as relações, as vezes eu quero mais.

Sou ambiciosa demais para esse mundo. Acredito então que já estou vivendo o meu inferno.

--

--